sábado, 14 de março de 2009

Lula: o plano 2014


Seja qual for o resultado das urnas em 2010, o presidente desenha seu futuro, que inclui a criação de um instituto, um "exílio" no sítio e caravanas internacionais. Tudo para voltar ao palácio do planalto nos braços do povo

Octávio Costa e Sérgio Pardellas
(ISTOÉ)

O presidente Lula considera "uma questão de honra" fazer seu sucessor em 2010 e também se mostra muito preocupado com os efeitos da crise econômica sobre a imagem de seu governo. Essa atitude pode passar a impressão de que suas atenções estão voltadas exclusivamente para a disputa eleitoral de 2010. Mas, na verdade, Lula está olhando mais à frente. A exemplo do que aconteceu com Getúlio Vargas em 1949, quando o presidente foi procurado por políticos no autoexílio para voltar ao poder (leia quadro na pág. 38), Lula acredita que poderá retornar ao Palácio do Planalto em 2014, nos braços do povo.

O presidente não consegue esconder de seus aliados a intenção de concorrer a um terceiro mandato daqui a cinco anos e já está movimentando as peças nessa direção. Quem for eleito em 2010 que se prepare. Lula trabalha para desbancá-lo na eleição seguinte. "Se as circunstâncias forem favoráveis eu vou me candidatar", tem afirmado o presidente. Em audiência em seu gabinete com integrantes da cúpula do PMDB em janeiro, o presidente fez menção direta ao assunto. A reunião foi para tratar do projeto do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que acaba com a reeleição e prevê mandato presidencial de cinco anos. Ainda falta submetê-lo a uma comissão especial e ao plenário.

"Independentemente desse projeto de fim da reeleição, não afasto a hipótese de disputar novamente a Presidência da República" Presidente Lula a integrantes do PMDB

ESTILO GETÚLIO

Em 1949, em meio às articulações para a sucessão do general Eurico Gaspar Dutra à Presidência da República, os trabalhistas ressentiam-se de um nome carismático capaz de apaixonar as massas e enfrentar nas urnas os então candidatos da UDN, brigadeiro Eduardo Gomes, o favorito da classe média, e Cristiano Machado, do PSD, que representava a continuidade ao governo em vigor. Foi então que políticos, lideranças sindicais e personalidades desembarcaram em São Borja, cidade do interior do Rio Grande do Sul, onde o ex-presidente Getúlio Vargas, desde que fora afastado do poder pelos militares, em 1945, mantinha-se num exílio voluntário, sem dar declarações, enfurnado em sua fazenda. Na conversa, os emissários do PTB mostraram a Getúlio que sua candidatura tinha amplo respaldo popular e que dificilmente ele deixaria de ser reconduzido ao Palácio do Catete, onde ocupou a mesa principal por 15 anos. A decisão de Getúlio de deixar a solidão dos Pampas e regressar ao poder foi anunciada na célebre entrevista ao jornalista Samuel

No encontro, Lula posicionou-se contrário à aprovação do fim da reeleição nesta legislatura. Argumentou que não seria positivo mudar as regras com o jogo em andamento. E acrescentou: "Essa medida só serve para organizar a fila do PSDB." Em outras palavras, atenderia ao desejo da cúpula tucana de tentar patrocinar um acordo entre os dois presidenciáveis do partido, os governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas Gerais, Aécio Neves. Sem a reeleição, Serra sairia candidato em 2015 e Aécio em 2020, já que é o mais jovem. Então, um dos peemedebistas presentes lembrou que a mudança na legislação permitiria a discussão jurídica de um terceiro mandato consecutivo de Lula. O presidente deu um largo sorriso e disse: "Independentemente desse projeto de fim da reeleição, não afasto a hipótese de disputar novamente a Presidência da República."

No caso de um oposicionista vencer as eleições presidenciais em 2010, o retorno de lula para disputar o planalto em 2014 é fato consumado. "Se o PSDB estiver no po der, a questão (Lula concorrer em 2014) é líquida e certa", disse à ISTOÉ o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, ainda um dos principais interlocutores do presidente. Na avaliação dele, o fato de Lula não ter embarcado na tese do terceiro mandato garantiu ainda mais legitimidade para preparar a volta. "Lula sabe que (o terceiro mandato) seria uma canoa furada", acrescentou.

Se Lula não admite abertamente um eventual retorno depois de deixar a Presidência em 2010, seus planos para os quatro anos longe do poder indicam que o presidente quer ficar o mais próximo possível da política e da vida partidária nacional, para manter seu cacife eleitoral. A reclusão, com a família, no sítio Fubangos, em São Bernardo do Campo, onde pretende se dedicar à pesca e preparar o já tão falado coelho assado na panela dificilmente durará mais do que alguns meses. Existe o desejo de descansar e curtir uma quarentena, mas certamente o sítio será transformado em QG de articulação política. O objetivo do presidente é fazer daquele pedaço de chão uma espécie de meca da peregrinação de lideranças políticas de diversos partidos.

"Alguém acha que o Lula vai ficar no seu sítio, cuidando dos netinhos e pescando na represa Billings? Aí eu respondo como eleitor do presidente: me engana que eu gosto", desafia o ex-ministro José Dirceu. "Perguntei ao presidente o que ele ia fazer ao deixar o Planalto", conta o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), um dos assíduos frequentadores da residência de Lula em São Bernardo do Campo. O presidente respondeu: "Mesmo fora do governo, vou continuar fazendo política." Um dos filhos do presidente, Marcos Lula, que trabalha na Prefeitura de São Bernardo, diz: "'É pouco provável que ele vá parar. Meu pai tem paixão pela família, mas a vida política também é considerada por ele muito importante."


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