
Vampiro mostra como a quadrilha agiu livremente na gestão de José Serra, sem ser investigada. E prova que Serra sabia  |                  
| Por Hugo Marques | 
O candidato a governador de São Paulo José Serra tem assuntos pendentes em Brasília. Entre março de 1998 e fevereiro de 2002, quando ocupou o cargo de ministro da Saúde, seis subordinados dele se juntaram à máfia dos “vampiros” para comprar derivados de sangue com dinheiro público – e a preços superfaturados. Todos foram indiciados; cinco deles, por formação de quadrilha. O relatório sigiloso da Operação Vampiro, que a Polícia Federal finalizou em agosto, concluiu que existia uma “organização criminosa” controlando as compras de hemoderivados na gestão Serra. Na quinta-feira 21, o procurador da República Gustavo Pessanha dava os últimos retoques no texto da denúncia que apresenta à Justiça Federal de Brasília, nesta segunda-feira 25. Empilhados, os documentos alcançam um metro de altura. Há detalhes no inquérito que podem trazer mais dores de cabeça para José Serra. Para começar, a investigação prova que Serra sabia da existência da quadrilha.
Em suas investigações, a Polícia Federal descobriu que, em 2001, chegou uma denúncia anônima encaminhada diretamente a José Serra e protocolada no Ministério da Saúde. Segundo o relatório da PF, a denúncia “dá conta da prática de diversos crimes”. Havia dois acusados. Um deles era Platão Fischer Puhler, diretor do Departamento de Programas Estratégicos e um dos homens de confiança do ministro. O outro era o empresário Jaisler Jabour, que mais tarde se descobriu ser o chefe do braço na iniciativa privada dos vampiros. Segundo a denúncia, Platão estava cometendo “as maiores barbaridades” no milionário setor de compras, em parceria com Jabour. Ele dizia que a preferência dos envolvidos era por compras internacionais, que facilitariam depósitos em contas bancárias estrangeiras. “O que está ocorrendo nesta área é um escândalo”, dizia a denúncia. A polícia constatou que Serra recebeu o documento. E leu. O que fez Serra? Em vez de protocolar um ofício formal na PF, mandou o próprio Platão, o acusado, ir lá para denunciar a si mesmo. Curiosamente, nada aconteceu. O caso dos vampiros só estourou três anos depois, durante o governo Lula.
Em maio último, Platão foi chamado pela PF para dar                explicações sobre os
         vampiros. Ele confirmou que aquela denúncia o acusava naquele                período de crime de extorsão. Platão confirma                que Serra pediu que ele fosse à PF, na companhia de Barjas                Negri, o então secretário-executivo que agora é                acusado pela família Vedoin de envolvimento com a máfia                das ambulâncias. Platão Fischer Puhler, àquela                altura, atuava como “curinga” de Serra, gozando de “muito                prestígio” junto ao ministro, conforme declarou o servidor                Nilton Pinheiro à PF. Por 15 anos, Nilton presidiu investigações                disciplinares contra servidores da Saúde, mas foi “encostado”                na gestão do tucano. Quando estourou a Operação                Vampiro, Nilton participou das apurações e descobriu                “dezenas de processos” pendentes de investigações                na Saúde. Ele contou na PF que sumiram inúmeros bens                e documentos na Central de Medicamentos, Ceme, quando o interventor                era Platão. Denunciou ainda uma compra em quantidade “exorbitante”                de espermicida Nonoxinol, para evitar
         gravidez na população de baixa renda.
 Outra testemunha-chave é a secretária de Platão,                Rozuíla Maura Cunha. Ela foi à
         PF e confirmou a compra de espermicida. Ela foi mais além                e detalhou como
         nasceu a idéia de montar um comitê eleitoral para Serra,                ainda em 2002. Platão, disse ela, afastou-se das funções                no Ministério para montar um comitê eleitoral
         na Asa Sul, no centro de Brasília. Platão chamou Rozuíla                para trabalhar por dois meses no comitê. A empresa Voetur,                contou Rozuíla à polícia, participou da montagem                do comitê pró-Serra, fornecendo telefones, estrutura                para computador
         e camisetas. Desde 2002, a Voetur vem sendo envolvida em sucessivas                denúncias de irregularidades em contratos com vários                ministérios. Rozuíla afirmou que Platão tinha                bom relacionamento com os empresários que representam a Voetur,                entre
         eles Raimundo Brasil. Os empresários, acrescentou, compareceram                várias vezes
         ao comitê de Serra. Ao final do depoimento de Rozuíla,                o delegado registrou que
         a Voetur aparece em auditorias do Ministério da Saúde                como empresa envolvida
         em possível fraude e que tal investigação deverá                ser sacramentada em inquérito próprio. O Ministério                da Saúde já pagou mais de R$ 80 milhões à                Voetur. Platão
         tinha sucessivas reuniões em sua sala com o vampiro Jabour,                segundo
         depoimento de Rozuíla.
A secretária-adjunta de Platão no Ministério da Saúde, Abadia Francisca de Araújo, confirmou que a Voetur pagou praticamente toda a montagem do comitê de Serra. “Platão comentou com todos que a Voetur foi quem bancou todas as despesas daquele comitê”, declarou Abadia. Ela revelou ainda que Platão viajava muito para o interior e para o Exterior com passagens pagas pelos laboratórios. Quando o Ministério pagava as passagens, disse, Platão não as utilizava e ainda trocava por dinheiro. “Todos os laboratórios bancavam passagens para Platão”, declarou. Platão tinha o hábito de receber presentes dos laboratórios, como relógios. Os presentes, revelou à PF, eram entregues na residência de Platão. Nessa época, o curinga de Serra levava a família todos os anos para um tour pela Europa. A secretária Rozuíla disse à PF que certa vez Platão pediu uma passagem aérea para um homem chamado Lincoln, da empresa Glaxxon.
 Motorista de Platão na Ceme e no Ministério da Saúde,                Manoel Ramos Macedo confirmou na PF as viagens gratuitas do chefe.                Ele diz ter levado Platão várias
         vezes ao hangar que ele se lembrava como sendo da Voetur. “Platão                dizia que ia pegar uma carona de avião, quase sempre com                destino a Uberaba”, disse o motorista. O curinga de Serra                começou a namorar uma moça chamada Taís. A                secretária-adjunta Abadia Francisca conta que Platão                deu à moça um apartamento
         e um carro. O pai da moça ganhou emprego na Voetur e a mãe                na Anvisa. Para cativar a moça, Abadia afirmou que Platão                “chegou ao ponto de utilizar o helicóptero” do                indiano Naresh. Trata-se de Naresh Kumae Vashist, representante                da Hetero Drugs, da Índia, fabricante de coquetel contra                Aids. Ele afirmou que
         Platão freqüentava sua residência, à noite.                Nessas visitas, contou o indiano à PF, Platão queria                convencer a Hetero a firmar parceria com a Nova Índia, fabricante                de genéricos veterinários em Uberaba, sua cidade.                Em seu depoimento à PF, Platão Fischer confirmou que                várias pessoas deram móveis, cadeiras, balões,                bolas e telefones para o comitê de Serra. Entre os empresários                que contribuíram, diz ele, estavam os senhores Brasil, da                Voetur, e Leoberto, da empresa Air Way. Mas o Comitê Nacional                do PSDB não declarou estas despesas na prestação                de contas apresentada ao Tribunal Superior Eleitoral.
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